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Litígio Societário: quais os critérios para pagamento do sócio excluído

O Superior Tribunal de Justiça pôs fim a discussão acerca dos critérios para pagamento do sócio que se retira da sociedade. De acordo com o tribunal, há dois critérios para pagamento dos haveres: um para o sócio de sociedade simples formada por profissionais liberais e outro para o sócio da sociedade empresária.
Ao julgar o REsp 958.116-PR, o STJ entendeu que a repercussão econômica do renome de um dos sócios não integra o cálculo na apuração de haveres em dissolução parcial de sociedade simples composta por profissionais liberais.Para os ministros, o renome é atributo personalíssimo, intransferível, fora do comércio e não indenizável a título de fundo de comércio. O renomado, ao deixar a sociedade, leva consigo todos os benefícios dessa circunstância. Decidiram os julgadores, ainda, que a apuração de haveres em sociedades simples de profissionais liberais deve seguir o art. 1.031 do CC, como se a sociedade fosse extinta, e o valor apurado deve ser dividido entre os sócios. Já quando se tratar de alienação de sociedade empresária, procede-se mediante apuração dos bens atuais mais a previsão de lucros.
Em outro REsp (1335619), os Ministros deram maior ênfase aos critérios acerca da sociedade empresária, cuja decisão tomou como base um julgamento antigo do STF (RE 89.464/SP de 04.05.1979), no qual ficou decidido que “deve ser assegurada ao sócio retirante situação de igualdade na apuração de haveres, fazendo-se esta com a maior amplitude possível, com a exata verificação, física e contábil, dos valores do ativo”. O raciocínio então desenvolvido foi de que se deveria conceber uma forma de liquidação que assegurasse, concomitantemente, a preservação do empreendimento e uma situação de igualdade entre os sócios.
Assim, segundo a decisão atual do STJ, “na dissolução de sociedade de responsabilidade limitada, a apuração de haveres (...) há de fazer-se como se dissolução total se tratasse”, salientando que a medida “tem por escopo preservar o quantum devido ao sócio retirante (...), evitando-se o locupletamento indevido da sociedade ou sócios remanescentes em detrimento dos retirantes”. Nesse contexto – em respeito à premissa adrede fixada, de preservação da sociedade e do montante devido ao sócio dissidente – mesmo que o contrato social eleja critério para a apuração de haveres, este somente prevalecerá caso haja a concordância das partes com o resultado alcançado. Havendo dissenso, faculta-se a adoção da via judicial, a fim de que seja determinada a melhor metodologia de liquidação, hipótese em que a cláusula contratual somente será aplicada em relação ao modo de pagamento.
Isso se justifica, porque o patrimônio de uma sociedade é composto por inúmeros elementos, os quais, possuindo valor econômico, devem estar espelhados nos haveres a serem pagos ao sócio dissidente, de modo a que este receba uma contrapartida justa pela sua retirada da sociedade. Com isso, segundo os Ministros, o melhor critério de liquidação de haveres a ser utilizado seria o chamado balanço de determinação, que refletiria o valor patrimonial real da empresa. Melhor explicando, o valor patrimonial é obtido dividindo-se o patrimônio líquido da sociedade pelo número de quotas. O valor do patrimônio líquido, por sua vez, irá variar conforme o critério adotado para elaboração do balanço. Por isso, na dissolução parcial, deve-se utilizar um levantamento do balanço que confira ao patrimônio líquido – e, por conseguinte, ao valor patrimonial – um valor real. Esse balanço, de acordo com os referidos precedentes, seria justamente o de determinação, que se contrapõe ao: (i) balanço periódico ou ordinário (reflete o valor patrimonial contábil, retratando a situação patrimonial da sociedade no encerramento do exercício social, sendo utilizado sobretudo para fins fiscais); (ii) balanço especial (reflete o valor patrimonial contábil em data presente, sendo utilizado para atualização do ativo e do passivo em virtude de fatos contábeis verificados ao longo do exercício social); (iii) balanço de cessão (reflete o valor patrimonial – econômico – de alienação da sociedade, sendo influenciado pelos interesses que envolvem a negociação entre comprador e vendedor); e (iv) balanço de liquidação (reflete o valor patrimonial real para fins de encerramento da sociedade, com exclusão de bens intangíveis, que só existem com a empresa em funcionamento). O balanço de determinação utiliza um critério diferenciado de avaliação do ativo, que permite uma apuração fidedigna do patrimônio líquido. Os demais balanços, tendo em vista os objetivos a que se prestam, induzem distorções que comprometem a exatidão do valor patrimonial. Os balanços periódico e especial se baseiam no valor de aquisição dos ativos (inclusive por determinação legal), enquanto o balanço de determinação se baseia no valor de mercado, correspondendo a uma simulação da realização de todos os bens do ativo e da satisfação do passivo social, com vistas a apurar qual seria o acervo líquido da sociedade se ela estivesse sendo totalmente dissolvida naquela data. O balanço de cessão, por sua vez, apresenta uma avaliação variável do ativo, conforme as necessidades e os interesses das partes que negociam a alienação da sociedade, nem sempre refletindo o seu valor patrimonial efetivo. Já o balanço de liquidação, embora também se baseie no valor de mercado do ativo, parte do pressuposto de que este será totalmente realizado para encerramento das atividades da empresa. Diante disso, o cálculo desconsidera os bens intangíveis, que aderem à sociedade e só têm valor econômico enquanto a empresa estiver em atividade. Na dissolução parcial, a equiparação à dissolução total – para efeitos da apuração de haveres – constitui mera ficção legal, não se podendo olvidar que a sociedade irá, na prática, continuar em atividade, portanto beneficiando-se de seus bens intangíveis, cujo valor, naquele momento (de apuração de haveres), deve estar espelhado também nas cotas do sócio dissidente, que até então contribuiu para que formação desse patrimônio intangível. Constatou-se, portanto, que o balanço de determinação de fato se revela o mais apropriado para apuração dos haveres do sócio retirante. No que tange à aplicabilidade da metodologia do fluxo de caixa descontado à apuração de haveres do sócio dissidente, cumpre salientar, antes de mais nada, que esse modelo avaliatório objetiva, em última análise, estabelecer o preço de mercado da sociedade, ou seja, o valor patrimonial real da empresa. Por isso, ela é rotineiramente utilizada em operações de aquisição, fusão e incorporação de participações societárias. Trata-se, porém, de um método subjetivo, inexistindo regra ou consenso sobre quais variáveis devem obrigatoriamente compor o cálculo. Seja como for, no cálculo do fluxo de caixa descontado, tem-se por praxe a inclusão do patrimônio intangível da sociedade, que corporifica uma expectativa futura de capacidade de geração de caixa ou de excesso de valor do negócio. Dessa forma, concluiu-se que a utilização da metodologia do fluxo de caixa descontado vai ao encontro da jurisprudência do STJ, no sentido de que a apuração de haveres na dissolução parcial de sociedade limitada seja realizada mediante cálculo que aponte o valor patrimonial real da empresa. A própria orientação da Corte, de que a apuração de haveres se de por balanço de determinação – que, repise-se, compreende os bens intangíveis da sociedade – sinaliza a possibilidade de utilização do fluxo de caixa descontado.